

Maria Mailho
20 anos
Natural de Vila Nova de Gaia
Maria Mailho é estudante de direito na Universidade de Coimbra e vice-presidente do Grupo Ecológico da Associação Académica da mesma instituição. Pretende prosseguir os seus estudos na área do direito ambiental e dos direitos humanos.
Foi durante a pandemia que Maria começou a interessar-se por esta temática e quis “levantar-se, literalmente”, e começar a trabalhar para tentar mudar o rumo atual do planeta, juntando-se a organizações e movimentos em Coimbra, como a Greve Climática Estudantil. Passando por várias formas de luta, como manifestações e ações de sensibilização, Maria atua também no espaço da academia através de workshops, mesas redondas e atividades culturais. Maria revela-nos quais as maiores dificuldades que sente e apresenta soluções possíveis.
Em que momento é que decidiste ser ativista ambiental? O que é que te levou a estar mais envolvida neste tipo de projetos e no ativismo ambiental?
Eu comecei a estar mais envolvida nestes projetos no meu primeiro ano de Universidade. Sou “caloira Covid” e, durante o ano inteiro, fiquei parada, sem fazer nada. O que fiz foi procurar nas redes sociais o máximo de informação que conseguia sobre os projetos e os movimentos cá em Coimbra. À medida que descobria mais sobre o que acontecia em Coimbra, comecei também a pensar mais sobre o que acontecia mundialmente. Houve algo em mim que me levou a pensar: eu não posso estar simplesmente parada sem fazer nada. Tenho que começar, tenho que me levantar, literalmente, e sair. Fazer alguma coisa para tentar mudar a situação em que estamos, para conseguir um futuro mais justo, um futuro melhor. A partir daí, comecei a envolver-me mais na [Associação] Académica e noutros movimentos e organizações.
De que forma exerces o teu ativismo ambiental? Iniciaste o processo no âmbito da Associação Académica?
O primeiro movimento que integrei foi a Greve Climática Estudantil de Coimbra. Adorei trabalhar com pessoas que defendiam e queriam as mesmas coisas que eu. Era bastante satisfatório.
Com o tempo, integrei-me na Académica. Primeiro, na secção de direitos humanos, que também tem muito a ver com o ambiente, por causa dos direitos dos refugiados. Depois, comecei a fazer parte como membro do plenário e, entretanto, entrei como membro efetivo da direção do Grupo Ecológico, que é uma secção cultural da Académica. Ultimamente, sou vice-presidente do Grupo Ecológico da Académica.
Como membro da Greve, trabalho com ambientalistas aqui de Coimbra, com qualquer movimento, qualquer organização, com projetos da Académica, projetos da Universidade de Coimbra (UC), com imensos núcleos da UC dos diferentes cursos. Trabalha-se com qualquer pessoa na área do ambiente, o que é incrível!
Que tipo de ações é que vocês fazem mais, dentro da Greve ou dentro do núcleo da Académica?
Na Greve, fazemos muitas manifestações e ações de sensibilização. A Greve Climática é uma continuação da Greve da Greta Thunberg, que se alastrou a nível mundial. Durante o ano, fazemos duas manifestações, vamos fazendo ações de sensibilização de outras organizações, algumas palestras e esse tipo de coisas.
Na secção do Grupo Ecológico, basicamente, fazemos de tudo. Só para expor o que me vem à cabeça: colaboramos com projetos da UC, com outros núcleos – havia um projeto que queria fazer hortas verticais em repúblicas; também colaboramos com outras secções culturais, como a secção Gastronomia; com professores da própria faculdade, que têm workshops; também fazemos a Semana Verde, com várias atividades numa semana, com palestras, rodas de conversa; mas também tivemos sessões de cinema, em repúblicas, sobre o ambiente, documentários… Nós procuramos também promover essa coesão entre os núcleos e os estudantes.
Estavas a dizer que fizeram as sessões de cinema em conjugação com as repúblicas e, portanto, tentam, aqui, também ligar a cultura…?
Sim, temos sempre presente essa ideia da cultura. Também fazemos projetos com os núcleos de estudantes. Agora, temos um projeto que é a recolha das sebentas, mas também tivemos um para a recolha de guarda-chuvas estragados. Também temos um projeto com a Queima [das Fitas] muito importante, que são os copos reutilizáveis – eu acho que aí no Porto também têm.
Na Queima das Fitas, em Coimbra, quem implantou isso foi o Grupo Ecológico, que fez pressão com a Queima para se implementar os copos reutilizáveis. Outra grande mudança, cá na Académica, foi implementada nas cantinas, em que o Grupo Ecológico fez pressão na Universidade para se tirarem os papéis dos tabuleiros, para não haver todo esse gasto de papel.
Outra coisa que acontecia todos os anos era a Garraiada e o Grupo Ecológico fez pressão para a Queima das Fitas parar com isso. São algumas coisas muito grandes que o Grupo Ecológico fez, que trouxeram muita mudança, a nível da cultura, em mandatos anteriores.
Este ano, o Grupo Ecológico foi quase dissolvido, porque, infelizmente, não havia nenhuma lista para se candidatar. Estivemos um ano em comissão administrativa e, entretanto, eu e uma colega decidimos formar uma lista, porque não fazia sentido o Grupo Ecológico extinguir-se. Na minha opinião, é o grupo mais importante na Associação Académica. Agora, mantivemos o Grupo Ecológico e temos muita malta fixe na direção e no plenário, que eu tenho a certeza que, para o ano, vai continuar na direção e vai querer continuar com o Grupo. E isso é o que interessa: conseguirem continuar com estas iniciativas de ambientalismo e ecologia para os estudantes continuarem a fazer estas atividades na Académica.
Então, tiveste este desafio, que quase vos deitou abaixo. Há mais algum desafio que aches que se tenha atravessado no teu percurso ou no dos movimentos em que participas?
Claro! A questão da ecologia e do ambientalismo (acho que não é um tabu), émas algo que as pessoas não levam a sério, até agora. Por exemplo, o presidente da Câmara de Coimbra não quer declarar emergência climática. Acho que até o Governo não leva a sério a Greve Climática, nem estas questões. Mesmo com discussões a nível internacional, como a COP [Conference of the Parties das Nações Unidas sobre Alterações Climáticas], parece que nada vai para frente. E, a nível das coisas que fazemos cá, parece que os próprios estudantes, às vezes, não conseguem levar muito a sério e isso também joga muito com as tradições académicas, porque, muitas vezes, nós queremos mudar certas coisas a nível da academia, sem perder, obviamente, as tradições e cultura. Mas, mesmo assim, nós encontramos sempre ali alguma tensão.
Muitas vezes, nas manifestações da Greve Climática, há muitas pessoas que passam e mandam bocas e gritam. Às vezes, vemos as notícias em jornais e os comentários são terríveis, são pessoas a falarem mal de nós. Ainda hoje, estes temas não são bem-vindos nos meios sociais, não são conversas fáceis de se ter, não só com os mais velhos – porque normalmente são os mais velhos que nos vêem nas ruas e são as pessoas mais velhas que comentam nestes jornais, especialmente nos jornais de Coimbra -, mas até a nível dos estudantes, porque nós tentamos muitas vezes atrair as pessoas mais novas para virem às atividades do Grupo Ecológico, parece que não é uma coisa que interessa, não querem saber, muitas vezes.
Nós temos aqui muitos entraves, das próprias pessoas. Eu acredito plenamente que, a partir da educação ambiental, conseguimos travar isto. Mas, também, que a educação ambiental tem de se fazer desde que se é criança e que, agora, com as pessoas mais velhas, é muito difícil… São alguns entraves que nós encontramos.
Falaste aqui na dificuldade em atrair jovens para este ativismo, o que é que achas que poderia ajudar a atrair os mais jovens para o movimento da justiça ambiental? Que mensagens tens para passar aos jovens que se queiram juntar à causa ambiental?
Eu acho que a primeira ideia que eu queria deixar muito clara é o combate ao dramatismo, passado muitas vezes pelas redes sociais e pelos media. É algo que já debati com os meus amigos: as redes sociais e os media não educam e este dramatismo, que parece que o mundo vai acabar, não é nenhuma educação, não é maneira de educar as pessoas e não serve de nada.
Eu acho que, hoje em dia, o mais certo que se pode fazer é mesmo ouvir as vozes da ciência e a comunidade científica. É, seguramente, por aí que podemos atrair os mais jovens. Foi também por aí que eu fiquei atraída: a ler artigos e a ver onde estávamos e como o planeta estava. Fez-me perceber a situação urgente e levou-me a querer fazer alguma coisa, a agir, porque, daqui a pouco, não vai haver volta e este é o nosso único planeta, a nossa única Terra.
Na minha opinião, terá de passar mesmo pela educação, para captar a atenção dos jovens. Aí, não se estaria a falar do ativismo, se calhar, como eu faço, mas de mudança de comportamentos, de estarem mais educados sobre a situação…
Eu também sou contra esta ideia de culpabilização individual. Eu acredito mais na ideia de que é preciso algum ato urgente das grandes empresas e dos governantes para isto tomar um rumo mesmo diferente. Acho que é necessário simplesmente educarmos as pessoas a pensar que a culpa não é sua, individualmente, mas destas grandes empresas, que fazem manipulação para se fazer esta reciclagem, consumir verde e toda esta ideia do capitalismo verde. Somos vítimas do interesse das grandes empresas e do lucro que elas querem obter. Essa educação, simplesmente, acho que já é imensa coisa; muito simplesmente chegarem a essa conclusão, já é muito importante. Enfim, acho que é mesmo a partir da educação…
E que mensagem é que achas que podes passar a outros jovens que se queiram juntar à causa ambiental? O que é que será a prioridade agora? É a educação de pares ou é juntarem-se a movimentos ou associações ou ações?…
Eu acho que tudo é muito importante agora. Principalmente a educação. Acho que se uma pessoa está interessada, obviamente tem que se educar. Se há dúvidas, falar com os colegas e esclarecer. Eu não tenho medo de debater sobre nada, mesmo quando eu não tenho certeza sobre alguma coisa, porque sei que não sou dona da razão.
Mas também acho importante a pessoa organizar-se, para que a sua voz seja ouvida. Porque eu também acredito que o ativismo individual é um bocado, como é que hei de dizer?…
Não vamos mudar o mundo sozinhos, individualmente…
Exatamente, eu acredito que tudo é feito em unidade e que nós vamos chegar lá em conjunto. E que o ativismo individual não vai mudar nada. É por causa disso que eu também me decidi a juntar a esses outros grupos, para conseguir realmente fazer alguma coisa e para sentir que tinha força com estas pessoas. Agora, eu sinto que tenho força com estas outras pessoas para que a nossa mensagem consiga ser ouvida. É muito isso que recomendo a estes jovens que querem ser ativistas: que se juntem a outros grupos para realmente conseguirem ser realmente ativistas, porque, o ativismo individual – vou dizer esta frase -, acho que não vale de nada. É isso. Pronto.
E, para finalizar, pergunto-te quais são os teus planos para o futuro? Onde é que gostavas de levar o ativismo e a luta climática?
Os meus planos para o futuro… na verdade, eu não sei. Não consigo pensar num futuro muito longo, mas quero, obviamente, continuar a trabalhar com o Grupo Ecológico, com a Greve Climática, na área do ambiente e ecologia. Quero fazer um mestrado nesta área, também – eu trabalho em direito, mas quero fazer nesta área. Quero dedicar-me a isto, fazer parte de outros movimentos, educar-me ainda mais sobre outras iniciativas, como o Climáximo, o ClimAção, e saber mais sobre outros projetos de Coimbra. Também temos o Movimento [Cívico] da Estação Nova, porque, infelizmente, a nossa estação de comboios vai fechar… Acho que educar-me sobre estes movimentos todos que vão surgindo com o tempo também faz parte de uma pessoa que é ativista. E acho que é basicamente isto, de uma maneira muito ampla.
Esta é a primeira entrevista a jovens ativistas pelo Clima, parte de um conjunto, que disponibilizaremos aqui no blog do Escolas pelo Planeta!