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No Centro Escolar da Chainça, em Abrantes, as árvores do pomar, criado no ano letivo 2017/2018, são todas distintas. Há, por exemplo, um pessegueiro, um marmeleiro, uma amendoeira, uma pereira, mas também um medronheiro – neste caso, um arbusto típico da região. “A piada do nosso pomar é que tem uma árvore de cada espécie. Por isso, é que é uma horta pedagógica”, explica o Carlos Bento, professor coordenador da horta e do pomar pedagógicos daquela escola.

A criação de uma horta, que, normalmente, serve o propósito de ser pedagógica, para além de, habitualmente, ser também biológica, foi um dos temas mais referidos pelos professores que preencheram o formulário disponível no site do Escolas pelo Planeta para a partilha de iniciativas de ação ambiental e climática levadas a cabo nas escolas. O Escolas pelo Planeta esteve à conversa com alguns destes professores e dá, agora, a conhecer as suas experiências.

Pessegueiro do Centro Escolar de Chainça – junho de 2020

Pessegueiro do Centro Escolar de Chainça – junho de 2020

No início do ano letivo, o Centro Escolar da Chainça atribui uma árvore e um talhão da horta a cada turma, para serem cuidados pelos alunos. À medida que os estudantes vão passando de ano, vão mudando de árvore e de canteiro e, desta forma, aprendem sobre os cuidados específicos de novas espécies a cada ano letivo.

A horta faz ligação às atividades em sala de aula. Com os produtos colhidos, os alunos preparam sopas, que cozinham num fogão portátil, e ficam a conhecer frutos que nunca antes haviam provado. Na horta, aprendem o léxico específico da agricultura, matemática ou a ter que lidar com a concorrência das ervas daninhas e com a curiosidade e o apetite de espécies alheias, como é o caso dos pardais e dos caracóis, que se deliciam com os petiscos que por lá crescem. “Este ano, tivemos que pôr, até, túneis por cima das plantas, para conseguirmos proteger dos pardais. Fizemos um espantalho, mas os pardais não têm medo! (…) Tudo isto são aprendizagens!”, indica o docente.

A colher um pé de alface no CED D. Maria Pia

A colher um pé de alface no CED D. Maria Pia

Também no Centro de Educação e Desenvolvimento (CED) D. Maria Pia, da Casa Pia de Lisboa, a horta pedagógica, que um grupo de professores iniciou há apenas um ano, já permite colher, para além dos produtos hortícolas, aprendizagens. Nesta escola, estão envolvidos, na manutenção da horta, os alunos do 1.º e do 3.º ciclo, os dos cursos profissionais e os de necessidades educativas especiais. “É espetacular ver alunos de necessidades educativas especiais irem à horta e vê-los, por exemplo, a descascarem ervilhas e trabalhar a motricidade fina e, depois, levarem isso para a matemática: contarem os bagos, subtraírem, etc.”, diz Telma Canavilhas, docente desta instituição de ensino. Semanalmente, “os alunos do ‘clube ambiental’ do 1.º ciclo vão à horta e participam nos diferentes trabalhos e os que pertencem ao projeto ‘crescer com ciência’ disponibilizaram um espantalho que eles fizeram e vários vasos que construíram, a partir de garrafas e de embalagens de detergentes, para nós plantarmos, principalmente, as aromáticas”, explica Teresa Ventura, docente do 1.º ciclo no CED D. Maria Pia.

 

Nesta escola, a planificação do 3.º ciclo foi alterada por causa dos Domínios de Autonomia Curricular que estão ligados ao meio ambiente. No 8.º ano, por exemplo, os alunos trabalham a horta no âmbito da disciplina de Físico-Química; no 9.º ano, relacionam-se com a horta através da disciplina de Cidadania e Desenvolvimento. “Começa a estar tudo muito intrincado”, conclui a professora.

 

Alexandra Pereira, professora do Agrupamento de Escolas de Infias-Vizela, considera a horta pedagógica fundamental no projeto Eco-escola, que coordena desde o ano letivo 2020/2021. “Vai ao encontro das ideias de proteção do planeta, de consumo de alimentos locais, do estudo das características do solo, da importância da água… Trabalhamos uma série de conteúdos de vários anos.”

 

Desde o ano letivo 2021/2022, a professora está a implementar um sistema de permacultura, tanto na horta como nos canteiros de ervas aromáticas, que surgiram nesse ano também. O princípio da permacultura (cultura permanente) é o de recriar os padrões da natureza e incorporar as características de cada cultura na gestão dos recursos naturais (energia, água, etc.) necessários para a sua manutenção, de forma harmoniosa, com respeito pelo ambiente. Em linha com esse mesmo conceito, nesta escola, foram semeados, por exemplo, tremoços para reter o azoto na terra, fundamental para a fertilidade dos solos e para o crescimento das plantas.

Pés de alface e de couve no CED D. Maria Pia

Pés de alface e de couve no CED D. Maria Pia

Nem tudo são rosas, neste jardim

Quando chegou à escola depois da interrupção da semana de Páscoa, Alexandra Pereira tinha tudo invadido pelas ervas daninhas. “O trabalho da horta é quase diário.” Por isso, a pensar nas férias do verão, no fim do ano passado, os professores tentaram plantar produtos que pudessem colher antes das férias. Para os canteiros das aromáticas, organizaram uma escala em que, duas vezes por semana, um(a) professor(a) voluntário(a) se deslocava à escola, para garantir a manutenção das plantas.

 

No CED D. Maria Pia, por exemplo, esta é a segunda tentativa de implementar a horta pedagógica. A primeira experiência foi, com o tempo, abandonada. Este novo ímpeto surgiu na sequência de alguns professores terem frequentado uma formação sobre como implementar uma horta pedagógica (e biológica), durante a pandemia.

 

“Uma horta pedagógica não pode ser uma ideia pontual, tem de funcionar a longo prazo como mais-valia para a escola”, defende Carlos Bento. A criação de uma horta exige dedicação a longo prazo e investimento inicial. Para Carlos Bento, a dada altura, “o projeto financia-se a si próprio e até a outros projetos”. No caso da escola de Chainça, implicou, contudo, inicialmente, a contratação de uma empresa para montar o sistema de rega.

Na horta do Centro Escolar de Chainça – novembro de 2017

Na horta do Centro Escolar de Chainça – novembro de 2017

A economia circular das hortas, um projeto de toda a comunidade

Há um aspeto em que todos os professores parecem concordar. É preciso assegurar o envolvimento de vários atores locais, incluindo de toda a comunidade escolar, que facilitem, em primeiro lugar, a criação da horta e, depois, a sua gestão.

No CED D. Maria Pia, a angariação de fundos para a implementação da horta começou pela produção de suculentas, que ainda vendem 2/3 vezes por ano. Os pais e a comunidade local, sabendo da iniciativa, contribuíram com vasos.

Em Vizela, o financiamento inicial veio da venda de manuais ao peso, de algum apoio que a escola conseguiu providenciar e da ajuda voluntária de todos os envolvidos, incluindo os alunos, que trouxeram de casa sementes e ervas para plantar. No ano letivo 2021/2022, a couve produzida foi vendida, o que lhes permitiu comprarem sementes e materiais. A alface e as ameixas foram consumidas na cantina e houve oportunidade de oferecer brócolos a alunos que não os conheciam.

“Faz a tua salada”, no Centro Escolar de Chainça – novembro de 2016

“Faz a tua salada”, no Centro Escolar de Chainça – novembro de 2016

Apanha de couves para sopa, no Centro Escolar de Chainça – fevereiro de 2020

Apanha de couves para sopa, no Centro Escolar de Chainça – fevereiro de 2020

Na escola de Chainça, a Associação de Pais é um parceiro chave, desde o seu início, contribuindo com o financiamento necessário para a criação da horta, ferramentas, regadores ou o carrinho de mão. É também a Associação de Pais que faz a gestão dos rendimentos do mercado biológico que a escola dinamiza, em cada estação do ano, em que vende os produtos hortícolas da horta e do pomar. O lucro permite o reinvestimento na horta e sobra valor para aplicar noutros setores, por exemplo, na biblioteca da escola. Pais e professores também trazem produtos de casa, para plantar ou semear na horta.

Terreno no CED D. Maria Pia

Terreno no CED D. Maria Pia

No CED D. Maria Pia, a junta de freguesia foi essencial para preparar o terreno para a horta, que tinha escalracho. Levou uma máquina para revolver a terra e continua a dar apoio, quando necessário. Em contrapartida, uma parte dos produtos colhidos é cedida para a mercearia social da junta de freguesia. Os restantes hortícolas são cedidos ao banco alimentar e ao restaurante pedagógico da própria instituição. Recentemente, os estudantes dos cursos profissionais de cozinha receberam formação para saberem que resíduos orgânicos podem ser separados para o compostor da horta. “Vai-se criando uma rede”, defende Telma Canavilhas.

Numa outra parceria, desta vez com uma empresa de produção de cogumelos, o CED D. Maria Pia recebe um subproduto dessa produção que é usado para fertilizar a terra e, em contrapartida, os estudantes de cozinha participam na confeção dos cogumelos em eventos que a empresa organiza e fazem visitas regulares à fábrica. “Então, é uma economia circular, na prática”, remata Telma Canavilhas.

Alunos do CED D. Maria Pia põem mãos à obra
Alunos do CED D. Maria Pia põem mãos à obra

Alunos do CED D. Maria Pia põem mãos à obra

O início – o que considerar para criar uma horta pedagógica?

Com base nas partilhas dos professores entrevistados e considerando as sugestões que deram para quem está a dar os primeiros passos, o Escolas pelo Planeta preparou alguns conselhos práticos a ter em conta para o arranque de um projeto de horta pedagógica:

  1. ponderar custos e vantagens: nem todas as escolas terão, pelos mais diversos motivos, capacidade para a implementação e manutenção de uma horta;
  2. planear: é muito bom haver entusiasmo por parte de quem inicia um projeto desta envergadura, mas é igualmente (se não mais) importante haver uma planificação cuidada das várias fases da criação e manutenção da horta, tendo em conta os recursos necessários e os disponíveis (que alunos/turmas podem participar, de que forma, quais os produtos a semear e em que época do ano, etc.);
  3. decidir, com o apoio da Direção da escola, qual o local onde poderá ser implementada a horta: o talhão de terreno disponível, em Chainça, para cada turma é de 2m por 0,80m; em Vizela, o espaço total ronda os 7m por 8m;
  4. determinar a verba inicial necessária, tendo em consideração: A – se é necessária a habilitação do terreno enquanto espaço agrícola; B – se é possível (e se se justifica) instalar um sistema de rega automático (no caso das escolas entrevistadas, aquelas que não o tinham queriam implementá-lo quando possível); C – de que forma podem ser angariados fundos para o arranque ou de que forma podem ser estabelecidas parcerias;
  5. envolver os alunos e, de preferência, desde tenra idade: naturalmente, o propósito de uma horta pedagógica é o de envolver os alunos e de a usar para ensinar os mais diversos conteúdos; mas, no dia a dia, com as diversas atividades extracurriculares em que se envolvem, sobretudo os alunos mais velhos, e a necessidade de cumprir escrupulosamente o currículo, a sua participação na manutenção da horta facilmente fica esquecida ou desorganizada; A – em Vizela, a escola tem delegados ambientais (2 alunos por turma) em todos os anos escolares (do 5.º ao 12.º ano) que se responsabilizam pela horta às quartas-feiras durante as tardes; B- no CED D. Maria Pia, neste ano letivo, querem criar uma rede de alunos para esta gestão – os Guardiões da Horta – começando pelos alunos do 1.º ciclo;
  6. envolver a restante comunidade escolar: atribuir horários aos funcionários e docentes da escola para a participação na manutenção da horta; e estar em rede com os colegas, colaborar, trocar ideias, mostrar-lhes as potencialidades da horta para o ensino das mais diversas disciplinas nos mais diversos anos;
  7. criar a figura do coordenador da horta, que poderá ser representada por diferentes pessoas ao longo do tempo: faz a coordenação do trabalho com as turmas e promove ligações com a comunidade local que representem uma mais-valia para a horta – uma deslocação das turmas numa visita de estudo (por exemplo, a estufas locais), trazer experiências de fora para a horta (um orador convidado, por exemplo);
  8. preparar um espaço para o armazenamento dos materiais de apoio: uma casa da horta, com ferramentas, regadores, carrinhos de mão, etc.;
  9. utilizar matéria orgânica para a fertilização dos solos, a partir da compostagem (por exemplo, feita a partir dos restos da própria horta), e incluir princípios da permacultura e/ou da agricultura biológica.

Para quem procura indicações específicas sobre a criação e a manutenção de uma horta biológica, o Escolas pelo Planeta sugere, ainda, alguns links interessantes:


Foto de capa: CED D. Maria Pia – Casa Pia de Lisboa

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